domingo, fevereiro 01, 2009

Decisões á portuguesa!


O Zé do Gás mandou-me esta reflecção (em baixo) de um colega dele biológo (Pedro Lourenço) sobre a instalação do novo aeroporto de Lisboa em Alcochete que adquire especial relevância após a queda de um avião em Nova Iorque a semana passada devido a um pássaro ter entrado no motor do avião.

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Carta aberta aos meios de comunicação portugueses,

Ainda há poucos dias assistimos através dos meios de comunicação à espectacular amaragem forçada de um avião de passageiros nas águas do Rio Hudson, junto a Nova Iorque. Na altura, foi sobejamente discutido o valor e perícia do piloto, que salvou os passageiros de morte certa, e a celeridade das embarcações que imediatamente recolheram os passageiros do avião sinistrado. Muito menos atenção recebeu a causa do acidente: o impacto de um bando de aves que causou a avaria dos dois motores do avião causando a queda (controlada) do aparelho.

A ocorrência de grandes concentrações de aves nas rotas de aproximação ou partida de aeronaves é um dos mais sérios desafios à aviação, mesmos nestes tempos modernos em que a tecnologia tantas vezes nos parece fazer imunes ao mundo natural que nos rodeia. Ainda no ano passado um outro avião teve também um problema semelhante em Itália, tendo sido obrigado a uma aterragem de emergência devido a um impacto com aves. Parece assim natural e óbvio que a escolha das localizações dos aeroportos deve ter em séria consideração este tipo de riscos relacionados com a avifauna.

Não será então estranho que o governo português pretenda construir o novo aeroporto internacional de Lisboa na margem esquerda do Estuário do Tejo, na proximidade daquela que é irrefutavelmente a zona do país com maior densidade e abundância de aves? Se até em Nova Iorque ocorrem bandos de aves capazes de derrubar um avião, que dizer do Estuário do Tejo que alberga anualmente mais de 100000 aves aquáticas durante o Inverno? Isto, já para não falar do facto de esta ser uma Reserva Natural já desde 1976, tendo sido classificada como tal exactamente pelo valor que tem para a conservação da avifauna. Mas não tenho duvidas que é sobretudo a segurança dos futuros passageiros e não a das aves que mais preocupará os nossos governantes.

Uma das questões mais sérias são as aves que não usam apenas o estuário, mas também as áreas agricolas envolventes, nomeadamente o Maçarico-de-bico-direito. Desde 2005 que trabalho num projecto da Universidade de Groningen, na Holanda, que foca a migração desta espécie de ocorrência comum na região do Estuário do Tejo. Estas aves reproduzem-se no Norte da Europa, nomeadamente na Holanda, migrando depois para a África Ocidental, onde passam os meses de Agosto a Novembro em países como o Senegal, a Guiné-Bissau e o Mali. A partir de Dezembro começam a migração de regresso às suas áreas de reprodução, parando em Portugal num período entre o final de Dezembro e o início de Março a fim de se alimentarem, sobretudo em arrozais, para obter a energia necessária para completar os seus vôos migratórios. Durante este período, tenho verificado todos os anos que se chegam a formar bandos de mais de 45000 aves, que se alimentam durante o dia em arrozais em redor dos estuários do Tejo e do Sado, passando a noite em zonas de sapal à beira dos rios.

Isto significa que temos bandos de dezenas de milhares de aves a fazerem vôos diários dos sapais para os arrozais e de volta. Várias destas zonas de arrozal ficam localizadas a pouca distância do Campo de Tiro de Alcochete, local de momento preferido para a localização do novo aeroporto. Mais gravemente, os referidos movimentos diários entre os arrozais e os sapais na orla do estuário levam os bandos de aves, que repito podem englobar dezenas de milhares de aves, a passar ainda mais próximo da localização provável do futuro aeroporto. Caso as rotas de aproximação e subida sejam paralelas ao estuário, como foi falado como medida para evitar a avifauna do estuário, os bandos de maçaricos iram cruzar essas rotas nos seus movimentos diários e, tratando-se de aves que voam a uma altitude considerável, poderão causar um grave risco de impacto para os aviões.

Por outro lado, no decurso deste projecto de investigação, marcámos muitas aves com anilhas de cor, usando combinações de cores que permitem identificar os indivíduos no campo, com o auxílio de um telescópio. A análise das observações destes indivíduos marcados mostra que ocorrem também movimentos entre as diferentes zonas de arrozal, incluindo movimentos entre entre o Sado e o Tejo, aumentando as possibilidades de bandos de aves cruzarem as rotas dos aviões.

Mas não são só os maçaricos que usam estes arrozais, muitas outras aves ocorrem nessas zonas e fazem movimentos na margem esquerda do Estuário do Tejo. Dois casos óbvios são as cegonhas, que se deslocam entre diferentes zonas de arrozal, e as gaivotas que se deslocam também diáriamente entre o estuário e as zonas agricolas (e não só os campos de arroz) envolventes, como ficou demonstrado por um indivíduo a que foi colocado um localizador GPS, na Holanda, e que foi seguido durante um ano, tendo migrado até Portugal e passado parte do Inverno no Tejo, onde fazia incursões frequentes até aos campos agricolas do concelho de Benavente. Tanto as cegonhas como as gaivotas são aves de porte consideravel e, no caso das gaivotas, ocorrem aos milhares na região em causa.

Posto isto, parece ser um absurdo a decisão de colocar um aeroporto neste local, mesmo que assim o tenha defendido o famoso estudo do LNEC, que no que respeita à avifauna foi efectuado em Novembro e como tal falhou por completo o período de maior abundância de aves que ocorre entre Dezembro e Março. Por outro lado, convém lembrar que o estudo não disse que este era o local ideal, disse apenas que era menos mau do que a outra localização proposta, na Ota, tendo em conta não só factores ambientais mas também uma série de outros aspectos sobre os quais não me posso pronunciar por saírem fora da minha área de especialidade. Foi também falado na altura que o problema das aves seria facilmente resolvido alterando a localização dos arrozais. Este ponto é no mínimo risível e demonstra um tremendo desconhecimento da situação pois tratam-se de largas centenas de hectares de campos de arroz, num dos principais núcleos de produção de arroz do país. Mesmo que todos estes campos pudessem ser removidos, não podem ser transpostos para outro local, pois a rizicultura só pode ser efectuada em zonas alagadiças ribeirinhas, locais que devido ao seu valor agricola já estão todos aproveitados para esse fim. Por outro lado, se a deslocalização dos arrozais talvez pudesse resolver a situação dos maçaricos-de-bico-direito, não mudaria o facto que milhares de aves ocorrem nesta região e usam tanto as zonas estuarianas como os campos agrícolas, incluindo outros cultivos que não o do arroz, movendo-se um pouco por toda a zona em bandos de maior ou menor dimensão. Finalmente, convém lembrar que o Maçarico-de-bico-direito é uma espécie ameaçada, incluída na lista vermelha da UICN (União Internacional para a Conservação da Natureza) pelo que a destruição de uma tão vasta área de habitat crítico para a espécie, como são estes arrozais, não pode ser vista de ânimo leve.

Penso que é essencial uma discussão profunda sobre a problemática das aves no que toca ao futuro aeroporto, tanto por motivos de segurança, como por questões ambientais e de conservação da biodiversidade. Na minha opinião esta questão torna de todo inviável o projecto de um aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete. Infelizmente este tema não tem recebido grande atenção por parte dos meios de comunicação nacionais, pelo que decidi escrever esta carta na esperança de poder assim trazer para a praça pública esta problemática. Trata-se de um assunto de extrema importância que pode fazer a diferença entre um futuro de viagens aéreas em segurança de e para Lisboa, ou de novas imagens espectaculares de amaragens de emergência não em Nova Iorque, mas em pleno Tejo.

Pedro Lourenço "

O que é intrigante é que em Portugal as decisões são tomadas para resguardar os interesses de alguns em detrimento dos interesses e património de todos; e claro lá está a opinião de especialistas é posta em segundo plano para que os interesses de alguns possam prevalecer! Mas pronto, eles apenas estão a governar a sua Coutada Pessoal! Como é que alguém pode dizer algo!??!!

3 comentários:

Anónimo disse...

Pois é.
A Ota era uma aldrabice do governo e os relatorios e estudos que andaram a fazer durante mais de 15 anos que por este motivo e outros apontavam a Ota como a melhor opcao foram vendidos pelos media e pela oposiçao como sendo uma fabricacao do PS para fazer alguem ganhar dinheiro com terrenos e tal.
Escusado será dizer que quem compra terrenos na Ota o fez á 15 anos e que simultaneamente comprou em Alcochete- estilo jogar na roleta: aposta-se no preto e no vermelho. Algum há de sair!

Alcochete é que era, e a populaça bateu palmas porque tudo o que seja denegrir o trabalho que o governo faz é sempre apoiado neste pais das bananas.
Se ouvesse um pelourinho no terreiro do paço todas as semanas se apedrejava lá um ministro!

Não interessou que o relatório do LNEC favorável a Alcochete fosse classificado pelos mais reputados técnicos nacionais como uma vergonha para o instituto de tão forçadas que eram as conclusões.

Também não interessou o relatório da EU que referia precisamente esta problemática do estuario - o maior da Europa!-e dos seus ecossistemas em conflito com um aeroporto que em hora de ponta irá poluir duas vezes o que polui a cidade inteira.

Agora lentamente se vai perceber que a decisao tomada teve tudo haver com lobbys e pressoes corporativas produzidos pela malta do PSD. O governo actual dada a pressao destes lobbys, dos media controlados pelos mesmo lobbys ( SIC, TVI, Publico, DN, Sol etc) e por um povo que se queixa de tudo e mais alguma coisa, teve que arrear a mola e aceitar o que a vontade de muitos impôs.
Fraqueza do governo talvez, mas na realidade depois de ver o autentico Golpe de Estado que se tem montado acerca do Freeport - uma repetiçao da conspiracao de 2005 que se provou em tribunal ter sido montada por Portas e Santana Lopes, e que originou condenações de vários incluindo a jornalista Inês Serra Lopes( isto nunca fez página em jornal algum! É esclarecedor da impunidade com que se assasina pessoal e politicamente em Potugal ( lembro PPedroso e FRodriges aquando do caso Casa Pia)- percebe-se que é muito dificil fazer seja o que for em Portugal, especialmente abanar os interesses instalados e o clientelismo corporativista do estado.


Resta-nos aguardar que o tempo prove que Alcochete é um erro, que o governo tinha razão com a Ota, e que mais recentemente se prove que todo este circo á volta do PM não passa disso mesmo.
Lembro ainda que desde que Socrates surgiu como numero um do PS ( depois do assasinato montado do Ferro e de quem lhe iria suceder, Pedroso)
já insinuaram que ele era gay, que tinha tirado um curso na farinha amparo ( como-se quem o acusa tive-se tirado o curso na Sorbonne!) denegriram o seu passado profissional e acusaram-no de ser um corrupto aquando da sua passagem pelo MA (freeport).
Tudo isto sem uma unica prova e com o claro apoio dos media que enchem primeiras páginas com disse-que-disses e boatos.

Tem graça o negócio do Citigroup em que Portugal foi prejudicado no equivalente a vários anos de PIB montado por Manuela Ferreira LEite caiu no esquecimento. Da mesma forma que caiu no esquecimento o facto de um dos Yes Mans de Cavaco ter sido recentemente envolvido na escandaleira do BPN...

O país está a saque desta gente que agora entrou em pânico porque vê que não vai ganhar as próximas eleições...

NeuroGlider disse...

André sem dúvida o que estás a dizer verdade. Mas eu nesta posta não pus em causa a localização do aeroporto, a sua construção nem sequer a sua necessidade. Pura e simplesmente não sei o suficiente para ter uma opinião consciênte! O que pretendi expôr foi a total desvalorização que em Portugal é dada a especialistas nacionais e instituições nacionais e em geral opiniões externas são mais valorizadas ou preferidas pelos políticos para sustentar decisões deste tipo. Não só isto é mau porque não ajuda a criar clusters tecnologicos que têm um competencia tecnica elevada como também cria um sentimento nacional de desvalorização do que é feito em Portugal. E tu sabes que isto é verdade. Mas concordo em absoluto contigo em relação ao modo de agir do PSD. É uma palhaçada!

Júlia Freire disse...

Morando eu perto do Rio Tejo tenho verificado o quanto este rio tem sofrido com a poluição. Na margem Sul do Estuário nos concelhos da Moita, Montijo e Alcochete existe um grande número de explorações de suinicultura, uma actividade agro-industrial que produz esgotos com grande quantidade de poluição.É realmente desumano o que andam a fazer a um dos rios mais bonitos da Europa o nosso rio Tejo.